Aniam

Notícias

Armas de fogo: “O tema é tratado de forma política e ideológica”

Publicado em: 03/05/2023

 

Na lista dos países mais violentos do mundo, o Brasil tem sido

marcado, historicamente, por casos envolvendo o uso de armas de

fogo. De acordo com dados do Atlas da Violência 2021, produzido pelo

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em parceria com o

Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o País registrou 43.892 mortes

por arma de fogo em 2019, o que representou uma taxa de 20,5 mortes

a cada grupo de 100 mil habitantes. É um patamar bastante elevado se

comparado ao de outras nações. Para se ter uma ideia, a taxa de

homicídios por arma de fogo nos Estados Unidos - um país conhecido

por sua cultura de porte de armas e forte lobby das empresas do setor -

é de 4,5 mortes para cada 100 mil habitantes, segundo dados do Centro

de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA. Outros países

latino-americanos também apresentam altas taxas de homicídios por

arma de fogo, como a Colômbia (31,9), México (23,1) e Venezuela (16,9).

 

No governo do ex-presidente Jair Bolsonaro, houve uma flexibilização

das regras e do aparato de controle para venda e porte de armas no

País, o que levou especialistas a temer pelo desmonte completo da Lei

do Desarmamento, de 2003. “O tema vira polêmico e sensível porque é

tratado de forma política e ideológica”, afirma Salesio Nuhs, CEO

Global da fabricante de armas Taurus. Ele tem mais de 30 anos de

atuação no segmento, coordenou em 2005 campanha do referendo

popular sobre o comércio de armas de fogo no Brasil e foi responsável

pela reestruturação da Taurus no País e nos EUA. Em entrevista à

coluna, ele defende a criação de uma agência reguladora para esse

mercado, o que, na sua avaliação, poderia “contribuir para despolitizar

o assunto no País”.

 

As cifras são gigantescas. Esse mercado movimenta cerca de R$ 13

bilhões por ano no Brasil. Fundada em 1939 por empresários do Rio

Grande do Sul, a Taurus é líder mundial no segmento chamado de

armas leves, e mantém negócios em mais de 100 países. Em 2022, sua

receita líquida chegou a R$ 2,5 bilhões. A seguir, a entrevista de Nuhs:

 

Falar de armas é tratar de um tema sensível. Como o sr. analisa esse

mercado hoje no País?

 

O grande problema, como eu costumo dizer, é politizar esse ou

qualquer outro segmento de negócios do Brasil. A Taurus é uma

Empresa Estratégica de Defesa (EED), nomeada pelo Ministério da

Defesa em 2013 e, consequentemente, auditada regularmente por esse

ministério. O Estado brasileiro reconhece a Taurus como uma empresa

necessária e estratégica para a soberania nacional. O tema vira

polêmico e sensível porque é tratado de forma política e ideológica. No

meu entendimento, se fosse criada uma agência reguladora, a exemplo

de outras existentes no Brasil, isso contribuiria para despolitizar o

assunto e tratá-lo com a responsabilidade, por ser um segmento de

interesse estratégico da defesa e da segurança pública brasileira.

 

Ser flexível no controle de aquisição de armas ajuda ou atrapalha o

negócio no País?

 

O Brasil nunca foi flexível no controle e aquisição de armas de fogo. À

legislação de armas de fogo no Brasil é uma das mais rigorosas do

mundo. Inclusive, no caso de munições, a indústria nacional é pioneira

em marcação de munições, sendo o Brasil o único país do mundo que

faz esse controle. A indústria nacional consegue rastrear e identificar

os seus produtos em qualquer nível. Portanto, não vejo que exista

flexibilidade no controle de armas. Muito pelo contrário.

 

Como o Brasil se posiciona em relação a outros países nesse

mercado? Está equiparado, atrasado, avançado tanto em termos de

legislação quanto em investimentos, inovação e tecnologia?

 

O investimento em defesa e segurança pública no Brasil não é

adequado. Isso não é um posicionamento meu, já que não sou

especialista em defesa nacional e em segurança pública, mas é o que

evidenciam as estatísticas. No ranking de investimentos em defesa

militar, o Brasil é o 17.º país, segundo levantamento do Instituto

Estocolmo para a Paz Mundial (SIPRI, na sigla em inglês). O país

investiu cerca de US$ 19,2 bilhões na área de defesa em 2021,4,3% a

menos do que no ano anterior. Já os EUA, primeiro do ranking, investiu

USS$ 801 bilhões. O orçamento de defesa do Brasil representa 1% dos

gastos militares globais. No ranking do Global Fire Power, que analisa

os efetivos militares ativos disponíveis de 142 países sob o indicador

PowerIndex, o Brasil ocupa o 10.º lugar. A maior parte dos recursos

aplicados no setor passa longe do desenvolvimento da defesa no país.

Cerca de 80% dos gastos militares são destinados para a área

administrativa, para pagamentos de aposentadorias e pensões, por

exemplo.

 

E em relação à segurança pública?

 

No que se refere aos investimentos com segurança pública no Brasil, a

União e as prefeituras reduziram os gastos em 2021, de acordo com os

dados mais recentes divulgados pelo Fórum Brasileiro de Segurança

Pública. A maior retração ocorreu nos municípios: 7,5%. Já a União

diminuiu o gasto no setor em 3,4%. Segundo o Anuário Brasileiro de

Segurança Pública 2022, os recursos oriundos da loteria federal

tornaram-se exclusivamente a fonte de receita dos dois principais

fundos da área de segurança pública. Isso significa, portanto, que o

governo federal reduziu as despesas na área. Entendemos que o Brasil

precisa de muito mais investimento, principalmente em inovação e

tecnologia, áreas que a Taurus considera de extrema importância.

Investimos demais em inovação, tecnologia e desenvolvimento das

pessoas na Taurus.

 

Como o sr. avalia o mercado internacional de armas? É promissor?

Por quê?

 

A Taurus exporta, em média, 80% da sua produção. O mundo está

investindo na área de defesa e segurança. Segundo levantamento do

Instituto Estocolmo para a Paz Mundial, publicado em 2022, os gastos

militares mundiais chegaram a US$ 2,1 trilhões em 2021, valor 0,7%

maior do que em 2020 e 12% maior do que em 2012. Pelo sétimo ano

consecutivo, os gastos militares tiveram aumento no mundo. A Guerra

da Ucrânia e as tensões entre EUA e China na Ásia colocaram o mundo

em rota de aumento dos gastos militares, com ao menos 20 países

anunciando incrementos nos orçamentos de defesa em 2022. Rússia,

Europa e Ásia tiveram aumentos reais, acima da inflação, nas despesas

bélicas ao longo do ano passado. Além disso, esse é um mercado que

cresce nos Estados Unidos, que é o maior mercado de armas do

mundo, 7% ao ano nos últimos 20 anos. Portanto, o mercado

internacional é importante e tem uma alta demanda, por conta da

preocupação das pessoas com a defesa pessoal, da família e da

propriedade, e também para a segurança pública e soberania nacional.

 

O Brasil é considerado um dos países mais violentos do mundo.

Como vê isso estando à frente de uma empresa como a Taurus?

 

Eu acho que isso não é um desafio por eu estar à frente de uma

empresa como a Taurus. Eu acho que é preciso despolitizar o tema e

avaliar as causas da violência no Brasil. Em 2022, o Brasil registrou o

menor número de assassinatos da série histórica compilada pelo

Fórum Brasileiro de Segurança Pública desde 2007 e pelo Monitor da

Violência, que coleta dados desde 2018. Houve uma redução de mais de

18 mil casos de mortes no país por ano, desde 2018. Isso considerando

os últimos quatro anos, onde mais de 1 milhão de armas novas foram

registradas. O número de licenças para armas de fogo subiu 473,6% de

2018 a 2022, segundo dados do Anuário de Segurança Pública. O

aumento dos registros de armas no país, no entanto, não contribuiu

para o aumento da violência. Pelo contrário, houve uma redução.

 

A Taurus lançou recentemente supressores - silenciadores - e novos

modelos de revólveres. São necessários novos investimentos nesse

setor? Por quê?

 

A inovação em materiais além de propiciar maior competitividade, traz

diversos benefícios ao Brasil, contribuindo para o desenvolvimento,

crescimento econômico e geração de renda e emprego para a

sociedade. Para se ter uma ideia, o setor de armas e munições emprega

mais de 70 mil pessoas, registra anualmente faturamento de cerca de

R$ 13 bilhões e recolhe aproximadamente R$ 2,8 bilhões em impostos

por ano. A Taurus investe muito em tecnologia, inovação e

desenvolvimento das pessoas promovendo impactos positivos na

economia, na sociedade e no meio ambiente. Nos últimos dois anos,

foram investidos mais de R$ 330 milhões em estrutura física

(renovação do parque fabril), em P&D (pesquisa e desenvolvimento) e

em modernos equipamentos. Esse aporte, além de agregar valor aos

produtos Taurus, agregam valor ao Brasil, possibilita o aumento da

qualificação das pessoas, torna os processos mais eficientes,

consequentemente reduzindo a geração de resíduos, efluentes e

emissão de poluentes, agrega valor às reservas minerais brasileira com

o desenvolvimento e utilização de novos materiais, gera empregos e

incentiva programas de inclusão social, como o Taurus do Bem que

visa promover a inclusão de pessoas com deficiência intelectual no

ambiente de trabalho, possibilitando o desenvolvimento pessoal e

profissional por meio de capacitações técnicas.

 

Poderia dar mais detalhes?

 

A indústria estratégica de defesa tem papel importante na segurança

nacional, na economia e no apoio e desenvolvimento de novas

tecnologias. As principais tecnologias do mundo vieram da área de

defesa, como a internet, GPS, microchips, VANT (veículos aéreos não

tripulados, que no mercado civil são popularmente conhecidos como

drones), dentre tantas outras.

 

A Taurus tem parcerias inéditas com renomadas instituições de ensino

que atuam em linha com as mais avançadas soluções tecnológicas do

mundo e é a empresa do setor que mais investe e desenvolve

tecnologias de materiais, de processos e produtos. Inclusive, investe

fortemente na capacitação e desenvolvimento contínuo das pessoas,

por meio de seu programa de qualificação acadêmica e profissional

que visa contribuir com a educação continuada dos colaboradores em

cursos de graduação, pós-graduação, mestrado e doutorado. Toda

nossa equipe de profissionais é qualificada no Brasil, isso é muito

importante, principalmente por tratar-se de execução de atividades

especializadas que demandam formações específicas na área.

 

Um exemplo da forte estratégia da empresa baseada na formação das

pessoas é o programa realizado no Centro Integrado de Tecnologia e

Engenharia Brasil/EUA (CITE) da Taurus para capacitar engenheiros de

produtos, processos e qualidade. Atualmente, o CITE conta com mais

de 200 engenheiros formados e que atualmente desenvolvem projetos

de novos produtos, processos e tecnologia, agregando valor aos

produtos, reduzindo custo de produção e adotando as melhores

práticas.

 

O Centro Integrado de Tecnologia e Engenharia Brasil/Estados Unidos

- CITE é base do forte ritmo de lançamentos da companhia e o

pioneirismo está entre as qualidades que levaram a Taurus a ocupar

um lugar destaque na indústria. A partir do lançamento da primeira

arma com grafeno, a GX4 Graphene, a Taurus iniciou a terceira geração

de pistolas, uma tecnologia inédita desenvolvida em território nacional

para o resto do mundo. E seguimos inovando.

 

Fonte: https://veja.abril.com.br/coluna/neuza-sanches/armas-de-fogo-o-tema-e-tratado-de-forma-politica-e-ideologica

Fonte: (Veja-BR - WEB)